1 de dezembro de 2015

"The funeral of hearts."

Ele não sabia o quanto eu gostava dele. O quanto eu gostava mais de livros que de pessoas e que, quanto mais eu lia, menos eu queria viver essa vida. Não sabia que de tanto olhar pra ele e imaginar o que ele poderia estar pensando eu esquecia de olhar pra mim e pensar em algo além dele. Eu não sabia o quanto eu poderia sentir sono quando estivesse com alguém que não fosse ele, e que cada vez que eu era obrigada a socializar num mundo onde ele não estava era o mesmo que ouvir zunidos ao invés de vozes. Eu tinha me perdido nesse ideal de universo, porque eu não sabia mais o que fazer, porque cada livro na minha estante era um amigo que me faltava e já conto 189. Talvez me faltasse também vontade de ser alguém sem ele, porque eu acreditava que o que eu sentia não passava de uma memória que eu escolhi guardar pra ter algo a que me apegar. Alguma coisa que me desse vontade de segurar forte, porque eu tinha essa mania de deixar todo mundo ir. Eu não segurava as pessoas. Elas me entediam facilmente e eu queria algo perfeito, pronto, sem nenhuma preocupação a me oferecer. Porque eu odeio coisas desalinhadas, pessoas imprevisíveis e surpresas. Odeio quando meu computador não fica em linha reta na minha mesa, ou quando eu sublinho frases em textos e erro. Odeio o que fica fora de lugar e eu não posso colocar de volta. Eu sempre iria parecer louca e destinada a ser só porque não pode existir assim que nem eu e eu não posso aguentar a falta de regras e horários definidos. A minha órbita não gira igual a dos outros seres humanos e talvez seja por isso que eu não consigo funcionar na mesma frequência de pensamento deles. Mas ele sabia que eu era assim, isso ele sabia. Ele sabe.

15 de maio de 2015

"Que tipo de homem escreve uma história de amor?"

Eu preferia ficar em casa lendo. Odiava sair e ver gente. Só gostava de ver você. Mas você gostava de ver gente. E eu reclamava e pirava e a gente parecia dois doidos perdidos que uma hora ou outra iam acabar se matando. E eu gostava tanto de você e dos seus cabelos longos e ficava desiludida quando você resolvia cortar e me aparecia feito um menino de onze anos, com um sorriso de moleque na cara, implorando por amor. Mas era tão lindo. E eu não me imaginava vivendo uma vida sem essa tua meninice sem fim, apesar do trabalho que você me dava. Às vezes eu pensava se não tava te criando pro mundo. E eu tinha tanto medo de te preparar pra tudo e você voar feito passarinho que cansou do ninho. Eu não era um ninho. Você que era o meu. E você também gostava do meu cabelo e dizia que era minha cor. E me fazia ouvir umas bandas esquisitas e a gente andava a pé na rua porque nessa época ninguém tinha carro. E eu lembro daquela vez que você tava doente e veio me ver de todo jeito e eu te beijava e sentia aquele calor da febre e você não tava nem aí. Você nunca se preocupava com nada mas só queria que eu saísse de casa. E eu, com meus pouco mais de um metro e meio de altura, parecia um pinguim de geladeira do teu lado. Eu era tão desequilibrada e sem vontade de nada que eu só queria ter você e um livro pra ler. Eu sabia que a gente ia se deixar um dia, mas também sabia que ia voltar. Por que você tinha que ser tão tão tão assim e eu ser tão tão tãozinho. E o menino viraria homem e eu continuaria no mesmo lugar, esperando a banda passar, esperando o sinal fechar, virar mulher feito um clichê ambulante com zero criatividade pra continuar vivendo. Você aprenderia muita coisa mas no final continuaria com o mesmo jeito de quem não tá nem aí. Nem aqui. Porque você dizia que tudo tinha que ser do meu jeito mas você não era do meu jeito e eu queria tanto tanto tanto. Queria te ter menino numa gaiola sem porta pra você se libertar. Mas sempre tem uma janela.

14 de maio de 2015

"Get out while you can."

Eu sabia que acordar nesse dia não era uma boa opção. Mas eu tinha que ir ao médico fazer exame sei lá de que - esses exames que a gente faz quando não tem doença e fica querendo encontrar uma. Culpa da minha mãe. Culpa dela porque, se não fosse por ela, eu não iria aos médicos. Eu tenho pavor à medicina. Eu tenho pavor à ideia de que a gente tá ali, com umas dores na unha, vai no médico e descobre que tem que retirar a vesícula. "Mas eu nem sabia que precisava de vesícula." E como precisava. Faz uma falta danada essa tal de vesícula. Mais falta que aquele namorado que você morria de amores por ele. Você só nota que aquela coisinha existia quando a perde. É a mesma coisa que uma relação entre seres humanos. Mas o meu ponto é que eu sabia que, mais uma vez, ia dar tudo errado nesse dia. Porque o despertador tocou oito horas mas só consegui abrir os olhos às nove. Porque sonhei que ganhava na loteria. Porque tinha que lavar o cabelo. Porque tinha que escrever algo pra monografia - só consegui escrever uma página e um título - o que já é algo, porque não sei lidar com a ideia de criar títulos. E ai a médica disse que tô bem. "Vamo passar uns exames de rotina." Exame de sangue de novo. Ela não podia passar ultrassom, eu não podia beber aquele tanto de água e vomitar mais uma vez na clínica onde todo mundo já tinha gravado minha cara porque eu já tinha vomitado três vezes por lá. "Não passa ultrassom." Não passou. Exame de sangue. Outro dilema. Minhas veias são tão problemáticas quanto minha própria vida. Acho que o stress reflete no meu sangue e ele resolve que não quer sair, não importa se tem uma agulha e uma seringa ali, implorando pra que ele venha. Não sai. Ai aquela maldita enfermeira aperta meu braço pro sangue sair. E ele sai, mas é tão à força, como que quem é puxado pelos cabelos. "Volta aqui pra mostrar os resultados." Não vou voltar. Não quero saber quais doenças eu tenho ou quais possíveis doenças poderei ter. E eu tinha medo de perguntar aos céus se mais alguma coisa podia piorar porque eu sabia a resposta. Sabia que podia porque minha vida é essa eterna provação: tá ruim, mas piora. E ai eu tinha que ir pra aula. O dilema de ir, ter um horário e ficar esperando até às dez pelo meu irmão. E o mal estar que me dá ao pensar na ideia de ficar sentada naquele banco duro onde parece que logo, logo não vou mais conseguir levantar de lá. E olhar pra aquelas pessoas que eu sei que não gostam de mim porque todo mundo sabe que ninguém gosta de mim. Deve ter muita coisa errada comigo. Não tem aula. Eu sabia, sabia. Que até nas coisas mais simples, o universo resolve que não vai dar certo pra mim. Não vai dar certo e pronto. Não pode fugir à regra. Essa regra desengonçada de que se pode dar errado, vai dar. E era só mais uma quinta-feira normal. E faltava tanto ainda pra vida acabar. 

8 de maio de 2015

"You disregard the mess while I try to control the world."

Uma da manhã e você me tirou da cama. E nem tá aqui. E nem vai saber disso porque não vai ler esse besteirol todo que eu escrevo. E ai que eu tava pronta pra dormir e decidida a acordar um ser humano melhor porque as pessoas não são obrigadas a lidar com isso que eu sou, chata pra caralho. E toda errada. Mas se tinha alguém pra nascer errada, Deus me escolheu. E você era um idiota. Continua sendo, porque me faz escrever essas chatices que ninguém aguenta mais. Nem eu. Mas eu não consigo ficar em paz comigo mesma enquanto não me liberto. E meu estômago tá doendo desde cedo e eu queria tanto dormir mas mente vazia é oficina do diabo e meu sono foi embora. Obrigada, eu devo dizer. Por ser idiota. Mas eu tenho culpa no cartório por só preferir os idiotas porque eles são tão errados quanto eu. E eu sabia que ia dar tudo errado desde sempre mas eu preciso provar pra mim mesma que eu tenho razão. Até quando eu me fodo eu preciso ter razão. E eu tô ficando velha e cada vez mais perdida e errada e eu ainda boto fé que um dia vou acordar sabendo o que eu quero e quem eu quero. Ou sei lá, jogar tudo pro alto e sair berrando no meio da rua até que me levem pra alguma clínica e eu fique em paz sem obrigações. E eu fico encarando o teto e as paredes e pensando porque você tinha que ser todo errado também. Talvez porque quando alguém é certo eu estrago tudo sendo a errada e errando e ai quantos erros. Não me tira mais dessa cama. Fica ai na sua e eu na minha e bem de longe a gente vai se desviando e errando e odiando mais e mais os seres humanos que não erram porque ninguém pode errar tanto assim quanto a gente, pode? Dois fugitivos pirados perdidos.

27 de abril de 2015

"Fire meet gasoline."

- Adivinha em quem eu tô pensando.
- Eu sei.

Quem não sabia? Todo mundo sabia. Não era muito difícil adivinhar, mesmo depois de milhões de anos. Dinossauros até entraram em extinção, e eu aqui, pensando a mesma coisa. Que ninguém me pergunte os motivos, pois acho que só Jesus voltando à terra pra poder esclarecer o que se passa em minha cabeça quando a nostalgia resolve montar acampamento. Por que eu não podia ser uma pessoa normal? Apegar e desapegar. Gostar e desgostar e não gostar mais. Acontecia, é claro. Mas com você não. Porque, apesar de todas as merdas, apesar de não encontrar mais sentido pra nada, você continua aqui impregnado, sem me deixar em paz. Podia ser um fantasma, podia ser uma assombração. Mas não passa de uma lembrança atormentada. E ai eu durmo noites e noites sem nem lembrar do que existiu, mas em um tal momento resolvo sonhar e ai passo uns dias tentando relembrar coisas e coisas. E ai eu leio aqueles romances bobos que você odiava que eu lesse porque eu ficava iludida demais e ai a gente brigava, mas depois parecia que nada tinha acontecido. As ligações de madrugada, em que a gente passava mais tempo calado que conversando. E ai você tocava guitarra e cantava algum rock bom e eu devia ficar com sono, mas era impossível. Eu nunca ficava com sono quando se tratava da gente juntos, mesmo que juntos significasse você do outro lado da linha telefônica. E ai passavam três, quatro horas. Minha mãe acordava e brigava e ainda assim eu continuava te escutando tocar, sabendo que você colocou o telefone de lado. A gente era tão diferente e nem se entendia mas eu sabia que, de todo jeito, um era igual ao outro. E mesmo que todo mundo dissesse que não valia a pena, eu sabia que valia. Mesmo quando tudo foi por água abaixo e você disse que a gente ainda ia ficar junto e eu virei a cara. Eu nem queria conversa. E eu resolvi que ia deixar pra lá, não importava quanto tempo levasse. E hoje eu deixei pra lá e sei que, talvez, eu vá me ficar toda me tremendo quando te ver, mas eu não vou sentir nada. Como das outras vezes. E ai eu vou ficar te olhando, com vontade de te beijar, mas só pra deixar claro pra minha mente que não é aquilo que eu quero de verdade. E ai eu vou me desculpar. E vou dizer que não, a gente não vai ficar junto, porque nada é pra ser quando se trata de minha vida. Mesmo as coisas sendo, elas não são.

13 de abril de 2015

"Wild horses."

O que tivesse pra dar errado, daria. Isso tinha virado mais que um lema, era uma certeza. Certeza de que nada daria certo porque não se permitia que as coisas dessem certo. Tinha que estragar, pelo menos para ter um pouquinho de tortura até o fim daqueles dias. Sempre dizia que não ia mais beber, porque nem era viciada nem nada. Só bebia pra passar o tempo, pra conseguir conversar com as pessoas estranhas mais que duas palavrinhas. Mas se passasse da conta ia dar merda. De novo. Não podia sair se desculpando por ai como se tivesse culpa. Tinha, sabia. Mas lembrava de pouco ou quase nada e que assim ficasse. Lembrar era pior. O que aquela gente toda fazia ali? Será que as pessoas realmente se gostavam nesse mundo? Que esquisito. Desconhecia esse sentimento. Desconhecia o gosto de gostar das pessoas. Mas as abraçava e beijava e dizia oi tudo bom. E continuava a beber mesmo sabendo que, ao chegar em casa, o mundo ia girar e não ia conseguir se segurar sozinha. A mesma coisa de sempre. A pressão nos ouvidos fazia parecer que estava num avião a sei lá quantos metros de altura. Não escutava nada e queria gritar porque que agonia insuportável. Respirar fundo e oi tudo bom. Tinha que sorrir para os conhecidos e também desconhecidos porque queria saber o que era gostar das pessoas e queria saber se as pessoas gostariam dela mas é claro que não gostariam porque como as pessoas se gostam nesse mundo? Era péssima em tudo. Botaria para fora o que podia e não podia, e depois ficaria mal por três dias se remoendo de todas as coisas que não lembrava. Que a vida fosse fácil de esquecer assim. Mas nem era. 

12 de março de 2015

"I fucked my way up to the top."

Tirei a roupa, batom, maquiagem. Amarrei o cabelo e sentei. Eu não sabia bem o que ia fazer. Talvez meditar ou esperar uma luz vinda do céu (que, no momento, não é mais que o teto do meu quarto). Olhava as paredes como se elas pudessem falar e me dar uma resposta pra tudo, porque tudo, agora, é só um imenso nada. Esperei aquela quantidade inútil de lágrimas saírem dos meus olhos, mas que conversa. Eu não sabia mais chorar. Antes era facinho: com pouco esforço e eu já parecia um bebê chorão. Antes sentir era fácil também. E agora eu me esforçava feito burro de carga pra sentir o que quer que fosse e na-da. Um vácuo me rodeando e eu tentando entender porquê. Eu sou esse tipo de gente: tá tudo encaminhado e bom demais, ai eu preciso estragar e por quê? Porque quando o mundo tá bem e feliz eu paro de sentir. Tinha emprego, namorado, quase que um futuro certo. Mas e dai? Tinha perdido a graça. E se eu tinha tudo entregue de bandeja qual o sentido? Eu ia estragar muita coisa ainda. E não ia me importar nem um pouco. Mas agora tô aqui, quase que de joelhos implorando pra Deus, pro universo, pra buda ou sei lá quem, um pouquinho de qualquer coisa. Nem o vento na cara quando eu dirigia emocionava. Nem olhar para as pessoas e observá-las conformada. Eu queria ser conformada. Aceitar que vou me formar e ter algo me esperando, tanto faz o que. Mas eu não consigo aceitar o tanto faz, porque eu quero mais. Eu preciso de mais. Muito. Exageradamente. De arrepios e algumas certezas, porque muitas eu não consigo lidar. Mas tudo bem. Tá tudo bem. Enquanto der pra botar um sorriso falso na cara e acordar todos os dias como se viver fosse normal, ia ficar tudo bem.

17 de fevereiro de 2015

"Tão só, tão só, profundamente raso, tão certamente errado."

Talvez eu devesse começar isso me desculpando porque provavelmente vou escrever as mesmas coisas que escrevi durante todo esse tempo que eu te escrevia sem saber pra quem. Vão faltar vírgulas porque eu gosto de colocar cada palavra aqui como se tivesse falando e aí não conseguiria falar devagar porque sei que vai sair tudo de uma vez e você provavelmente me odiaria porque devo parecer muito doida mas eu não sou doida eu juro. Eu já fui doida por você e já fui doida por mais um monte de caras mas tudo é tão diferente e eu queria que fosse o mesmo porque eu já saberia lidar. Mas eu não sei de cor nem o alfabeto de trás pra frente, o que eu iria saber de viver? Quantas vezes já não te disse essas mesmas palavras sabendo que não iriam significar nada porque pra gente as coisas deixam de significar. E eu paro todo dia para pensar que se você voltasse eu queria te receber de braços abertos porque eu queria algo certo mas se nada em mim é certo por que diabos nós seríamos? E seria mais divertido errar como a gente errou achando que o mundo ia acabar se a gente acabasse mas a gente acabou e o mundo continua aí e eu aqui e você por todos os lugares. Se eu te quisesse e você me quisesse e a gente quisesse o mundo todo de novo o que seria? Fosse o que fosse a gente ia seguir em frente e parar um dia pra se cumprimentar na rua e você vai sorrir como sempre e eu vou ficar desconfortável porque eu já não sinto mais nada e nem você e as pessoas acabaram superando a gente então deveríamos superar também. Mas eu gosto de dizer por aí que ser só é o melhor que a gente pode ser e é mentira porque se a gente é só a gente não sabe ser. 

29 de janeiro de 2015

As (des)vantagens de ser invisível.

Pensei no que eu poderia oferecer. Café? Mas eu odeio café. E não sei fazer nada. Sou péssima em qualquer coisa que envolva esforço. Na verdade, eu me perguntava, na maioria das vezes, qual o meu papel no mundo. Se Deus ou sei lá o que me colocou aqui com um objetivo. Devem ter desistido quando viram que não daria certo. Vinte e um anos se passaram. Eu sei que meu pai ainda se pergunta se valeu a pena pagar dois anos de faculdade particular por um curso que, sinceramente, me faz duvidar de tudo hoje. Eu me pergunto em que parte do caminho eu cheguei a me quebrar e esqueci de como era juntar os pedaços porque, hoje, eu não tô inteira. Nem metade. Deve ter sobrado um terço do que eu costumava ser. E minha mãe brinca sonhando com um futuro conformado pra mim. Que futuro? O dia de amanhã nem chegou e eu já ultrapassei os limites do cansaço. Hoje eu fui ler algo e dormi. E observo as pessoas seguindo em frente enquanto fico pra trás porque não sei seguir em frente. Tem tanta coisa que eu não sei e eu só queria alguém pra me ensinar. Mas tem tanta gente perdida igual a mim. Seria fácil se fosse matemática: positivo e positivo dá positivo; negativo e negativo também positivo. Eu seria um negativo. Queria tropeçar menos nos degraus do ônibus e conseguir dar bom dia ao senhor que fica na calçada do prédio que eu trabalho sem ficar desconfiada. Porque eu desconfio de todo mundo e acho que tanta felicidade estampada é puro disfarce. Ou não. Talvez eles sejam felizes e eu só procure desculpas pra achar que todo mundo tem uma vida tão deprimente quanto a minha. De se sentir só. De achar que todo mundo me deixou de lado porque eu não tenho nenhuma história interessante pra contar. Porque eu quero ser a melhor e, quando chego lá, não sobrou uma alma penada pra comemorar comigo. Parabéns. Todo mundo se esquece de todo mundo um dia.