28 de setembro de 2012

"Alguma coisa a gente tem que amar."

Eu esqueci de dizer pra minha mãe porque eu tô desistindo desse mundo aos pouquinhos. Esqueci de dizer pro meu pai que eu só quero dar orgulho a ele. Nunca fui revolucionária, nunca sai por ai levantando cartazes ou gritando para as pessoas que eu sou contra isso ou aquilo. Eu sou mais de ficar quieta, no canto, choramingando baixinho pra Deus, tentando entender onde foi que o ser humano errou. Acho que foi na falta de amor, sabe? A gente só pensa em crescer e crescer e esquece de sonhar, de ler histórias bonitas, inspiradoras. De querer imitar a literatura, os romances de cinema. E eu continuo conversando com meus botões enquanto vejo as pessoas perdendo suas almas, deixando-as jogadas por ai, nas calçadas, nas esquinas, nos bares. Eu desisto todo dia de sair de casa, de enfrentar os ônibus lotados e ouvir aquelas senhoras falarem sobre os assaltos, a morte de uma amiga querida, o perigo do mundo. Só consigo respondê-las com um "Deus me livre" ou "tá difícil mesmo". Dá medo, num dá? Da cidade grande, do ar noturno. Não sei se o mundo vai acabar ou se já acabou; se, ao tomar algumas vodkas, vou esquecer de tudo isso, ou se vou gritar que tá tudo errado, 'cês tão perdidinhos. Talvez não, talvez eu chegue naquele bêbado cansado, fumando um cigarro velho, e diga: "óh, vai pra casa, não desiste. Deixa o mundo pra lá e sonha, pega um papel e bota a alma nele. Lê um livro, se apaixona de novo, abraça aquele cara que você brigou. Gosta de quem ainda merece ser gostado." Algumas pessoas  vivem no automático, não pensam em um amanhã bonito, mas apenas em um amanhã. Mas tem uma gente por ai que acorda, se benze, toma café com leite gostoso, pão quentinho, sai na calçada para ir trabalhar e pensa: "vai que hoje o mundo resolve dá certo." 

25 de setembro de 2012

"Mais pesado que o céu".



Eu tinha 13 anos. Não sei se estava na adolescência ou ainda era apenas uma criança. Usava umas roupas rasgadas, all star velho, e sentava na calçada do colégio com os amigos, debaixo daquele sol de meio-dia, fugindo da hora de ir para casa. Eu tinha o cabelo preto, curto, caído no rosto: quase um menino. Era tão bom. Conversar sobre coisas banais, planejar um futuro bonito, todo mundo junto. A banda dos amigos, típica época de colégio. Feliz. O mundo era pequeno e a gente era grande. Nenhum dia jogado fora, nenhum fim de semana desperdiçado em casa de frente para a tv. Era música, literatura e sorrisos. 13 anos e ficando de castigo porque minha mãe não queria que eu namorasse, porque eu ficava de recuperação em matemática e física, porque eu fugia do reforço escolar pra comer bolo na padaria. "Cada um segue o seu caminho", uma amiga disse, e a gente ria. Uma hora ia acabar, mas, para a gente, naquele tempo, nada ia mudar o nosso mundo. Sei lá se as pessoas se afastam porque querem ou porque o mundo começa a girar rápido demais. Sei lá se é destino ou Deus ou a triste realidade da vida. Essas coisas eu prefiro não saber. Prefiro ficar aqui, deitada, olhando a biografia do Kurt Cobain que me custou uma boa quantidade de lágrimas. Prefiro ficar lembrando desse tempo como o melhor, como o mais alegre, que talvez nunca se apague da memória de ninguém.

23 de setembro de 2012

Uma parte que ficou.

Esqueci de ligar o despertador e, como já perdi a hora mesmo, fico escondida debaixo do lençol. Não vejo o teto branco do meu quarto e percebo que os filhos do vizinho resolveram me dar um dia de paz (ou algumas horas, nunca se sabe quando eles darão o golpe). O ventilador faz um barulho relaxante, quase como um zumbido baixo. O lençol acima de mim balança com o vento e aquilo me conforta. Nada me incomodava a não ser as engrenagens do meu cérebro me colocando para pensar nas coisas que eu já deveria ter esquecido. Faz tanto tempo... Alguns poucos anos, talvez três? Sou péssima em contas e não quero levantar o braço para contar nos dedos. Não é exatamente saudade que eu sinto. Ou é? Mas é claro que sim. Tantas pessoas vem e vão, eu me deixando ocupar pelos sentimentos novos. Só que nenhum foi tão bonito quanto aquele. Ia além da ansiedade, da vontade, do coração pulando. Ia além do que o que eu via nos filmes e nos livros. Era infantil e ao mesmo tempo parecia ter cem anos. Duraria uma vida. Ai acabou. Às vezes os dias são como hoje: eu perco a hora, deixo a mente vagar por onde ela achar melhor, e então ela inventa de cutucar um espacinho  especialmente reservado para essas memórias. Parece que foi ontem. Se me pedir para lembrar os dias, não conseguirei. Mas as palavras, os sorrisos, os abraços... Eu deveria deixar tudo isso fugir, desaparecer. Até deixo. Mas em domingos comuns, silenciosos, tudo volta. E é pensando nisso que acabo dormindo de novo, para acordar horas depois sem lembrar de nada.

"Feliz o destino da inocente vestal. Esquecendo o mundo e por ele sendo esquecida. 
Brilho eterno de uma mente sem lembranças. Toda prece é ouvida, toda graça se alcança..."
(Alexander Pope)

17 de setembro de 2012

Se minha vida fosse um livro.


A Culpa é das Estrelas,  John Green.

Me olhei no espelho e meu rosto estava da cor do meu cabelo, com exceção de umas manchas pretas por causa do rímel que tinha escorrido junto às lágrimas. E então comecei a pensar (como sempre acontece quando finalizo a leitura de um livro) como seria a minha vida se ela fosse um livro. Isso soa clichê, o que já faz entender que eu seria (sou?) uma personagem cheia de  clichês. Semana passada um amigo me disse que ele sabia viver, porque saía praticamente  todo dia. Eu não me considero uma pessoa (muito) anti-social. O que acontece é que não sei começar um diálogo com algum desconhecido, então, na maioria das vezes (ou quase sempre), passo o meu tempo em casa, deitada na cama, namorando um livro. O cheiro, o barulho das folhas passando, os personagens. É tudo de uma beleza só, de um amor que vai além das páginas. Eu não saberia escolher um gênero para definir minha vida: memórias eu tenho muitas, mas não suficientes; não vivi o bastante para ter uma biografia. Um romance? De Jane Austen a Nicholas Sparks existem muitas opções histórias. Talvez, no meu caso, ser uma Liesel Meminger cairia melhor. Alguém virá com aquela filosofia barata de que eu já sou personagem da minha própria vida. Olha, você, seja quem for, isso é coisa de gente conformada, de gente que só pensa em arrumar um emprego, um casamento bom e um casal de filhos sejam o orgulho da família. Ouso dizer que não é isso que quero para mim. Ouso dizer que, apesar de não ter um futuro escrito à caneta, já fiz alguns rascunhos. E, se minha vida fosse um livro, talvez eu tivesse uma história boa para contar, cheia de sorrisos e lágrimas, e um amor para a vida toda.


15 de setembro de 2012

Uma canção.

Senta aqui, deixa eu te contar uma coisa: era difícil, sabe? Ficar longe, ter sonhos bonitos e acordar. Eu ficava mais tempo dormindo e pensando como minha cama seria o lugar ideal para passar o resto da vida. Ai eu te ouvi cantar. Não cantar, exatamente. Era um tipo de assobio. Um assobio feliz, cheio de alegria que, enquanto eu ouvia, automaticamente um sorriso me apareceu. Eu sei que dá vontade de jogar tudo para o alto e se esconder debaixo da cama. Penso nisso principalmente quando aparece alguma barata aqui. Sim, uma barata! Corro para a cozinha e caio no choro. Aquele monstro que não se move e me encara. Me arrepio dos pés à cabeça, procuro um vizinho bondoso para me livrar daquele tormento, mas todos estão ocupados demais vivendo suas vidas. E eu sem conseguir matar uma barata! Rezo, faço promessa, pego o veneno e digo que terei coragem para matá-la, mas não tenho. "Não quero mais morar aqui", digo entre lágrimas. Normalmente levo de quarenta minutos a uma hora para me livrar daquela coisa. E por causa de uma barata eu já quis sumir do mundo! De vez em quando junta tudo, eu sei: uma barata, um grito da vizinha, a água que acaba do nada, o porteiro que não vem nos fins de semana... E vem saudade, falta de companhia, o cheiro bom que ficou no lençol. Mas ai eu lembro que te ouvi assobiar calmamente, sem preocupação, fazendo um ovo mexido para o café-da-manhã. Uma música desconhecida, talvez criação sua, talvez obra do momento. O que eu quero dizer é que em um momento ou em outro eu vou puxar meus cabelos e dizer que a vida tá uma merda. Eu faço isso, sempre. Mas quero te pedir para continuar assobiando por ai, despercebido por uns, encantando outros, e fazendo sorrir o mundo.

10 de setembro de 2012

Dois.

Eu estava lendo um livro quando a porta bateu e você chegou. Cansado. Na verdade, exausto. A secretária nova do escritório passava o dia cantando, e ela tinha uma voz fina, te deixava com dor de cabeça. Fiz um café, mesmo sabendo que você odeia quando me meto a fazer qualquer coisa na cozinha. "Te falta o dom", você diz. Enquanto você jogava o café no ralo da pia (fiz com carinho, eu juro!) e falava sobre mais-um-dia-comum, me esparramei no sofá e peguei uma revista, fingindo ler qualquer coisa ali. "Você nunca me ouve", e faz uma cara de menino birrento, de criança que bate o pé quando pede algo a mãe e ela simplesmente continua a conversar com a amiga tagarela. Você era todo lindo: desde o cabelo meio crescido e bagunçado até o dedo do pé. Eu te gostava por inteiro, nenhum defeito sequer. Você sentou no sofá e colocou minhas pernas por cima das suas. E ficou ali, meio que cochilando, meio que olhando para o céu que pintava a varanda. Te puxei para mais perto e beijei cada pedaço do teu rosto: nariz, olhos, bochechas... É sexta-feira. Alguns casais saem com os amigos. Alguns casais saem e se divertem por ai como se o mundo fosse acabar. A gente fica aqui, deitado, encolhidos num sofá de dois lugares. Você cozinharia ou pediríamos comida? "Não sinto fome nem sede com você." E eu poderia ficar te olhando sorrir para mim a noite toda, o tempo todo, a vida toda. Mas a vida toda ainda é pouco tempo para nós.

9 de setembro de 2012

Eu tive um sonho.

Hoje eu acordei pensando em como minha vida seria se eu conseguisse decidir alguma coisa por mim mesma, por menor que fosse. Arriscar em cozinhar algo diferente, pegar um ônibus aleatório e me aventurar por ai, ou até me declarar para alguém. Qualquer coisa que surpreendesse. Qualquer coisa que fizesse minha mente viajar para um lugar diferente, um mundo oposto a esse meu. Acordar cedo, tomar um  banho gelado, preparar meu café-da-manhã, esperar a carona. Todos os dias comuns. Sol, calor, suor, pessoas que passam e não se olham, pessoas que passam e se olham e se esquecem. No condomínio, aquele "bom dia" do vizinho, sem sentido, sem vontade. Essa semana, ao voltar para casa, uma mulher me ignorou no ônibus. "Oi! A senhora vai sentar nessa cadeira?" Com uma cara feia, ela responde que havia acabado de levantar. "Er, obrigado." Sorrio torto, para mostrar alguma simpatia e boa educação. Falta inspiração no mundo. "Logo você falando isso?", alguém diria. Eu tenho certa dificuldade em sorrir para desconhecidos, desde sempre. Mas quando se mora longe de casa, quando é necessário pedir uma informação boba, é bonito colocar um sorriso no rosto. E receber outro sorriso em troca. Isso sim inspira a alma. Isso sim faz a gente ter vontade de acordar todos os dias, com preguiça, mas com coragem. Coragem de sorrir mais, de escrever, de cantarolar desafinado, de dar um "bom dia" querendo realmente um bom dia.

3 de setembro de 2012

Falta um título pra tanto pensamento.

Não sei mais escrever. Sei lá se algum dia eu soube. Anda tudo tão corrido e cansativo que, quando pego um papel e uma caneta para botar umas palavrinhas, por mais simples que sejam, para fora, não saem. Penso no sono, na cama bagunçada, no barulho vindo do apartamento de cima, o choro do bebê que me fazem ter vontade de gritar um "cala a boca!" "Mas é só um bebê", eu penso comigo. Eu tô deixando a vida fugir de mim sem nem correr atrás, e vez em quando paro para pensar: "será que vou me arrepender daqui a cinco, dez anos?" Sei lá. Nunca sei de nada. Meio que tenho mania de não fazer as coisas certas, de ficar receosa, "melindrosa" (como diz minha mãe), sempre chorona. Sempre querendo resolver as coisas no choro. É assim que é não crescer? Não querer que o tempo passe? Ver as pessoas pensando num futuro, querendo terminar a faculdade, casar, ter filhos... Enquanto eu fico só pedindo pro tempo parar, ficar onde tá. Sabe, tá bom, tá legal. Desse jeitinho eu consigo. Sorrir meio torto ao ouvir os sonhos realistas dos outros, e ficar calada, guardando os meus pobres clichês para mim. 

"Os jovens não têm o monopólio dos corações partidos, sabe."
(A Última Carta de  Amor)